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  • Foto do escritorCarvalho Pereira Fortini

RECUPERAÇÃO JUDICIAL DE EMPRESAS: DESAFIOS E POSSIBILIDADES

Vladimir Moreira - Diretor da MMX Mineração e Metálicos S/A


Recentemente tive a oportunidade de participar do processo de reestruturação da empresa MMX Sudeste Mineração S/A, o qual  culminou com a distribuição de pedido de recuperação judicial como forma de superar a situação de crise econômico-financeira e posterior aprovação do plano de recuperação.


A aprovação desse em meio à insegurança e incertezas do ambiente econômico do país e após o encerramento de um ciclo virtuoso da atividade de mineração de ferro, é mais uma demonstração inequívoca da qualidade dos ativos e da viabilidade dos projetos de Eike Batista. 


A decisão de se pedir a recuperação judicial de uma empresa é apenas uma etapa entre várias outras, todas coordenadas entre si com o objetivo de superar a situação de crise vivenciada por ela, preservando sua atividade econômica e função social,  os empregos e os interesses dos credores.


A primeira etapa ou fase desse processo inicia-se com uma série de decisões extremamente complexas e difíceis ao administrador. Importam no reconhecimento da incapacidade da empresa em cumprir com todas as obrigações assumidas, no conhecimento ou reconhecimento dos erros administrativos e das circunstancias macro e microeconômicas responsáveis pela situação de crise.


Ato continuo, dá-se início a um profundo processo de redefinição e readequação da atividade empresarial com impactos em todos os setores e estruturas da empresa em recuperação.


Tal processo envolve não só o exercício diário de gestão de custos e um rigoroso controle do fluxo de caixa, como também escolhas entre o que  é importante para a manutenção da atividade empresarial e o que lhe é prioritário, essencial para a superação do período de crise.


Para o administrador, o processo de reestruturação de uma empresa testa sua capacidade de gerir equipes multidisciplinares sob extrema tensão e a lidar com temas e conhecimentos técnicos invariavelmente diversos daqueles até então mantidos no dia a dia.


Paralelamente, os executivos da empresa em recuperação passam a discutir e a negociar com os credores o plano de recuperação. Tais discussões são extremamente complexas e difíceis, não raro permeadas por pesado fardo emocional.


A complexidade na elaboração de um plano decorre não só das dificuldades em se encontrarem as melhores alternativas de pagamento  aos credores,  sem comprometer a capacidade futura de recuperação da empresa, mas sobretudo da necessidade de se comporem interesses heterogêneos, mesmo entre aqueles credores que detenham créditos da mesma natureza. Essa etapa do processo deve ser iniciada o mais rápido possível e a empresa em recuperação, deve centralizar as negociações em um pequeno e seleto grupo de negociadores. Apresentado o plano de recuperação judicial e devidamente aprovado pela Assembleia Geral de Credores, dá-se início à derradeira fase do processo, com a homologação judicial. 


Com a experiência de participar da gestão de uma empresa em recuperação judicial e como o responsável pelos assuntos legais da companhia, permito-me concluir que,  mesmo reconhecendo os enormes avanços trazidos pela Lei de Recuperação judicial – Lei 11.101 de 09 de fevereiro de 2005, ainda existem lacunas legais e regulatórias que precisam ser sanadas com a máxima urgência pelo legislador, sob pena de criar enorme descredito ao instituto de recuperação judicial.


Entre todas as dificuldades encontradas durante o processo de recuperação judicial, pontuo as falhas e omissões legais mais impactantes para o sucesso da recuperação.


1. Ausência de linhas de créditos específicas para as empresas em recuperação.


O interesse na preservação de uma empresa que gera empregos, paga impostos, enfim, produz e distribui riquezas,  é de todo corpo social em que está inserida e não apenas de seus acionistas.


Uma empresa em crise precisa de recursos financeiros para sobreviver e supera-la , incluindo-se, aí, o próprio processo de recuperação judicial, que é muito caro. A lei de recuperação judicial não cria alternativas reais e concretas para que a empresa possa se financiar.


Tão logo a situação de crise é observada, bancos e instituições financeiras cortam linhas de crédito, antecipam vencimentos de contratos, o que impede que novos recursos financeiros possam oxigenar e manter as atividades da empresa.


Nesse sentido, o Brasil precisa, a exemplo de outros países, criar alternativas para estimular o financiamento das empresas comprovadamente viáveis, seja por meio de aberturas de linhas de créditos específicas de bancos públicos, seja por meio de estímulos fiscais para as instituições financeiras ou fundos privados que aloquem recursos nessas empresas.  Uma espécie de parceria público-privada para a viabilização de empresas em crise e que tenham um papel relevante para a economia onde estão inseridas.


2. Os conflitos de Competência e os Riscos de Sucessão.


Passados mais de 10 (dez) anos da publicação da Lei de Recuperação Judicial - Lei n. 11.101 de 09 de Fevereiro de 2005, ainda são observados casos de conflitos de competência entre juízes da recuperação judicial e, principalmente, os trabalhistas. É o denominado conflito positivo de competência, quando dois ou mais juízes consideram investidos do poder/dever de julgar o mesmo caso ou processo.



Infelizmente, ainda existem juízes  trabalhistas - poucos é verdade, com uma visão segmentada de todo o complexo e extenso ordenamento jurídico brasileiro, segregando o arcabouço celetista de todas as demais normas jurídicas, como se a Justiça do Trabalho fosse um fim em si mesma e descolada de toda a realidade social envolvendo uma falência.

Trata-se de um erro grave, pois, além de prejudicar seriamente a empresa em recuperação, que sofre com os bloqueios online dos poucos recursos financeiros de que dispõe, tem um efeito nefasto para toda a comunidade de credores,. Estabelece-se, assim, um privilégio egoístico e ilegal para determinados credores em detrimento de todos, inclusive entre credores com recebíveis de mesma natureza.


Embora com menor incidência, também persistem decisões que consideram os novos investidores ou adquirentes de ativos de empresas em recuperação como sucessores dos passivos. Tais decisões afastam  o interesse no investimento ou reduzem consideravelmente os valores alcançáveis nas alienações de ativos ou participações no capital social das empresas em recuperação.


3. A novação de créditos imposta pelo Plano de Recuperação e os devedores solidários da empresa em recuperação.


Nesse aspecto temos a maior critica à lei de recuperação judicial.   Dispõe o artigo 59 da referida lei que o plano de recuperação judicial implica a novação dos créditos anteriores ao pedido (de recuperacao judicial). Novação em direito quer dizer alteração das obrigações,  a  substituição das obrigações antigas pela criação de novas.


Com a novação, ocorre a extinção da dívida antiga e o surgimento de uma nova, com valores e condições diversos daquelas que foram originalmente pactuadas.


Entretanto, paradoxalmente, a mesma lei que assegura a novação dos créditos por força do plano de recuperação judicial homologado, também assegura aos credores do devedor em recuperação judicial a manutenção do créditos e privilégios contra os coobrigados – devedores solidários.


Essa contradição decorrente da lei é nefasta para a empresa em recuperação judicial por diversas razões.  Em primeiro lugar, porque cria uma aberração jurídica, na medida  em que uma dívida extinta pela novação permanece válida em relação a terceiros. Em segundo, porque abre-se a possibilidade de determinados credores receberem duas vezes pelo mesmo crédito ou por créditos com a mesma origem, obrigando terceiros para com obrigações que eles mesmos desconhecem ou cujos ônus não quiseram  assumir.


Por fim, tal contradição coloca em risco o próprio instituto jurídico da recuperação judicial de empresas.


De fato, tal situação poderá fazer com que os sócios do devedor em crise e garantidores de determinadas dívidas não mais autorizem o pedido de recuperação judicial de suas empresas. Isso porque  o patrimônio pessoal de cada um continuará respondendo pela integralidade da divida, mesmo que ocorra a novação pela aprovação de plano de recuperação judicial pela comunidade de credores.


Não menos danosa será a hipótese – real e concreta – de o sócio e devedor solidário de uma empresa em recuperação alocar recursos em sua empresa durante o processo de recuperação. Trata-se de uma forma de financia-la até que a fase de crise seja superada, e tenha contra si uma penhora ou, o que é mais grave, o arresto exatamente daqueles recursos que  estão financiando os custos administrativos e operacionais da  empresa em recuperação.


Essa contradição legal pode fazer com que todo o processo de recuperação judicial, todo o trabalho e sacrifícios de quem está, direta ou indiretamente envolvido com a superação da crise econômico financeira  seja jogado por terra devido a um único credor com exclusivos e excludentes privilégios.

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