Carvalho Pereira Fortini
SENTENÇA DÁ ALENTO À APLICAÇÃO DA LEI
Há um alento no meio empresarial em labuta intensa nos tempos atuais em que sobram lamúrias! A lei de Recuperação de Judicial talvez não tenha sido tão contemplada como na sentença que deferiu o processamento da recuperação do Grupo Schahin no último dia 21.03.
Um alívio aos empresários – sobejamente em tempos de crise – como também aos credores de empresas que não se constrangem a se submeter este tipo de procedimento (Recuperação Judicial).
A Schahin foi uma das primeiras empresas envolvidas nas investigações da Operação Lava-Jato – marco na história do país – a requerer a condescendência Judicial para transigir os seus débitos a longo prazo sem compromisso da sua longevidade (e o que é a Recuperação Judicial?).
Pois bem, resultou na última semana o deferimento da Recuperação Judicial mesmo contra a majoritária recusa do Plano apresentado por uma segmentada categoria de credores (Garantia Real – autodenominado Sindicato de bancos) e do parecer contrário do Ministério Público.
Todavia, sobressai da brilhante sentença do Juiz Marcelo Barbosa Sacramone da 2ª. Vara de Falências e Recuperações Judiciais de São Paulo no processo 1037133-31.2015.8.26.0100, disponibilizada no site do TJSP (tjsp.jus.br), alguns movimentos interessantes que chamam a atenção à classe empresarial como um todo, e serve como um paradigma marcante na interpretação da lei 11.101/05.
Primeiramente, é importantíssimo destacar o espírito consagrado na lei (Recuperação Judicial) de que a empresa em situação emergencial na gestão dos seus débitos não pode simplesmente sucumbir e fechar as portas com encerramento das suas operações, há um contexto social a ser considerado – relações empregatícias, negócios comerciais de interesse geral – o qual não pode ser olvidado, mormente, na conjuntura econômica em que os procedimentos são processados, vide o artigo 47 da lei o qual prevê:
“Art. 47 - A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.”
A partir daí merece destaque a citação do ilustre Magistrado ao deferir a Recuperação Judicial contra alguns pontos técnicos que recomendariam sua falência, sua quebra, cuja repercussão, quiçá aportaria efeitos maléficos que nem de longe afagariam os interesses da maioria dos seus credores:
“O instituto da recuperação judicial foi concebido pela Lei 11.101/05 para promover a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica (art. 47, da LRF). O benefício concedido pela Lei aos empresários em crise objetiva permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores. ...
Cumpre aos credores verificarem se o plano econômico proposto pelo empresário devedor permitirá a plena recuperação da empresa, com a preservação dos postos de trabalho e das contrações celebradas.”
Contudo, não é só isso, havia um complô – se assim pode ser chamado – desmontado pelo ilustre Magistrado na inviabilização do Plano de Recuperação. A patranha desconstituída pelo MM. Juiz passou pela avaliação dos votos do referido “Sindicato”, em detrimento do todo (leia-se a grande parte dos credores da Schahin), através de ilações jurídicas de alta relevância que levaram-no à anulação dos votos desse autodenominado “Sindicato” por vício de vontade na simples e enxuta tese jurídica de intenção dolosa de malversar o Plano ou notoriamente aquebrantar a tentativa da própria Recuperação Judicial.
Nesse encalço sobressaem as considerações do Magistrado ao assinalar, em benefício da aplicação da lei e para alívio dos que enveredam pela Recuperação Judicial que:
“Um plano de recuperação judicial sem viabilidade econômica apenas imporia maior desgaste aos credores, já suprimidos da satisfação tempestiva de seus créditos. Entretanto, as condutas irracionais economicamente por parte dos credores, os quais, diante de uma crise reversível pela qual passa o empresário relutam em ficar restritos à finalidade do voto que lhe foram concedidos, apenas privariam o empresário em crise e os demais envolvidos com a empresa dos benefícios legais a que a lei poderia proporcionar através da recuperação judicial. ...”
Enfim, malgrados os arranjos que orbitam situações desta natureza, a decisão das últimas semanas sinaliza que o procedimento da Recuperação Judicial, a despeito do constrangimento mercadológico que impõe a uma empresa que se submete aos benefícios da lei, e a incerteza gerada aos seus credores, vem para concretizar a ideia de que “pior sem ela, melhor com ela” e que o contexto, a conjuntura social assinalada pelo brilhante Magistrado, justifica a gestão dos débitos a evitar uma quebra, uma falência, na qual todos sabem uns poucos se beneficiam, mormente, no caso da Schahin cujo patrimônio seguramente é menor do que o seu passivo, citando o autor do julgado:
“Se é certo que não há certeza de que os contratos serão renovados, ponto sobre o qual se debate o Ministério Público, também não há certeza de que a posição contratual poderia ser cedida onerosamente a terceiros, a ponto de reverter ativos para os credores de uma eventual Massa Falida. Tal dúvida é ainda maior diante da um eventual inadimplemento do contrato caso a atividade seja interrompida pela recuperanda e guarda ainda maior controvérsia diante do ramo específico e, portanto, da diminuta quantidade de agentes que poderiam continuar a desenvolver o contrato.
Não fosse isso o suficiente, em eventual falência, os credores reais apenas seriam satisfeitos na medida de sua garantia. As garantias dos referidos credores é baseada nas ações das companhias. ...”
Importante referenciar no caso em questão, tomado como paradigma positivo no cenário atual, o MM. Juiz ousa em tratar da incerteza de renovação do contrato com a Petrobrás (a ocorrer em 2020), assinalando que melhor aos credores a insegura garantia de cumprimento proporcional das suas obrigações, que a própria segurança da quebra abrupta, efeito da falência decretada – ao que tudo indica, condição inexorável se aceita a rejeição dos votos inválidos, viciados do aludido “Sindicato”.
Vale mencionar que diante da investigação da Operação Lava-Jato, há o risco inclusive de que os contratos do grupo em questão (Schahin) sejam totalmente anulados, desconsiderados sobre a ótica da validade jurídica, a saber!
Neste diapasão, o que vale ao credor, assegurar a perspectiva mais positiva e longeva de recebimento do seu ativo ou a realização imediata do seu prejuízo?
O fato é que há um alento de que a Recuperação Judicial (sobrelevada na decisão do Juiz Marcelo Barbosa Sacramone) é sim instrumento necessário e pontual para se manter viva a atividade empresarial, e a sentença atualíssima – é bem verdade que desafia recursos voluntários – congratula o sentimento transcendental da lei de que pior ao mercado ver uma empresa encerrar as suas operações; então que dê-lhe sobrevida para nos engendramentos comerciais gerir o seu passivo judicialmente – eis aí a nova ordem jurídica intervencionista nas relações individuais - obviamente com responsabilidade e intenção razoável e legítima de sobressair ao momento de agrura que perpassa.